Moto ótima para viajar, econômica, confiável e confortável. (Fotos: Mário Bock)
Confesso, sem vergonha nenhuma, que sou um fã ardoroso da Honda NX 350 Sahara desde o primeiro contato, que foi no teste das versões pré-série antes do lançamento oficial. Aliás já era fã da XLX 350R, mas odiava aquele maldito pedal de partida destruidor de canelas.
Não lembro mais em qual publicação eu estava trabalhando em janeiro de 1990, mas lembro de uma cena engraçada com a imprensa reunida para os testes feitos no litoral de SP. Nós esperávamos algo mais além de uma XLX 350 com partida elétrica e carenagem. Por isso, quando o assessor da Honda tirou a capa da moto e descreveu a novidade eu soltei a pérola que virou lenda:
– Sahara, um deserto de tecnologia!
Trocadilhos à parte, a Sahara foi uma das motos que mais aproveitei na vida. Nunca tive uma só minha, mas era a moto que eu costumava pedir para a Honda quando eu queria viajar. Com ela fiz viagens pelo Nordeste com histórias curiosas.
Estava com a proa rumo Ilhéus, BA, encontrar minhas filhas que estavam de férias. Quando estava atravessando Cachoeiro do Itapemirim parei para abastecer e dentro da loja tinha um CD Rei que eu não conhecia – e acho que pouca gente conhece – produzido pelo Frejat com músicas do Roberto e Erasmo Carlos. Eu tinha instalado fones de ouvido no capacete e feito uma complexa gambiarra para alimentar um tocador de CD enquanto viajava. Tudo com muito profissionalismo.
Numa das faixas, “Parei na contra mão” a música começa com um som de carro se aproximando e dando uma freada brusca. Cada vez que começava a faixa eu levava um baita susto e me jogava pro acostamento achando que seria atropelado por um maluco. Quilômetros depois eu esquecia e me assustava de novo. Achei melhor não ouvir mais.
Tributo ao Roberto e Erasmo, vale a pena ouvir. Clique na imagem para ouvir algumas faixas.
O outro folclore nesta mesma viagem foi a minha chegada em Ilhéus. Assim que entrei na cidade dei de cara com uma faixa com a frase “O povo de Ilhéus saúda Geraldo Simões!”. Pronto, quase tive um treco! Como eles descobriram que eu estava chegando na cidade? E qual meu nível de importância no universo baiano para receber tamanha homenagem? Mais um pouco e vi outra faixa. Fiquei imaginando que alguém tivesse ligado na redação da revista Duas Rodas e sabia da minha viagem. Resolveram me prestar essa homenagem. Mas era tudo muito estranho.
Até que fui abastecer a moto e quando entreguei a folha do cheque o frentista comentou:
– Ôxe, você tem o mesmo nome do prefeito que acabou de ser eleito!
Voltei à minha insignificante existência!
Com uma Sahara eu também fiz o Enduro da Lua Cheia, em Criciúma, SC. Eu nunca tinha feito trilha à noite, mas a moto foi de uma valentia incrível. Equipada com pneus Pirelli Garacross, relação mais curta e luz auxiliar até que eu estava indo muito bem. Cheguei a ficar em terceiro lugar na categoria Pro até a metade da prova, quando apareceu um pequeno, mas profundo atoleiro. Seria fácil de superar se um animal de chifre não tivesse parado bem no meio! Precisei parar, a moto afundou até o tanque e a partida elétrica foi pro espaço. Deu um curto no punho direito e eu não tinha como desmontar aquilo no escuro. Precisei ser rebocado e perdi qualquer chance de classificação!
Recentemente perdi a chance de comprar uma Sahara 93 igual esta do teste. A moto era de coleção, com menos de 10.000 km rodados. Apareceu justamente numa época que eu estava sem grana, mas o valor era uma pechincha. Pecado, porque é uma das poucas motos dos anos 90 que eu teria na garagem. A evolução da Sahara foi a NX 400 Falcon, que nunca tive muita simpatia. Para atender as exigências de emissões a Falcon ficou bem próxima da Sahara. O visual mais moderno sem a carenagem e ganhou freio a disco na roda traseira. Mas sempre curti mais a velha, carismática e infalível Sahara.
Curta o teste publicado na edição 214 da Duas Rodas, com fotos do grande Mário Bock, ajuda do Jeferson Martins (empinador oficial de motos) e medições feitas por mim.
Endireitei a imagem porque na revista ela ficou invertida.
Honda NX 350 Sahara
Uma moto, três usos
No campo, na cidade ou na estrada, a NX 350 Sahara 93 mostra versatilidade e um novo grafismo
O mais recente proprietário de uma Honda NX 350 Sahara, novinha, 93, corre para mostrar a moto para toda família.
– Olhem, comprei três motos! anuncia.
Ninguém entende quando olha para a garagem e vê apenas uma.
- Sim, são três explica uma estradeira para viajar nos fins de semana; uma fora-de-estrada para relaxar nas estradinhas de terra ao redor do sítio e uma urbana para ir e voltar do trabalho todos os dias.
A Honda NX 350 Sahara é isso mesmo: três em uma. Desde que foi lançada, em 1990, em substituição à XLX 350R, a Sahara mostrou-se uma interessante opção para quem quer uma moto versátil capaz de enfrentar várias situações, sem exigir uma pilotagem "profissional”. Motor elástico, suspensões de curso longo, economia de combustível e boa velocidade são as qualidades desse modelo, que tem ainda um importante item de conforto: partida elétrica.
Para 1993 a Honda não mexeu na parte mecânica. Em compensação trocou o visual sóbrio das versões anteriores por uma decoração moderna, agressiva e cores metálicas bem vivas. O resultado foi uma moto que chama atenção por onde passa, chegando a ser confundida com modelos importados ou de maior cilindrada.
O motor é um quatro tempos, monocilíndrico, de exatos 339cc que desenvolve potência máxima de 31,5 cv a 7.500 rpm e torque máximo de 3,13 kgf.m a 6.500 rpm. Não são dados excepcionais, mas podem levar a Sahara a uma velocidade máxima de quase 140 km/h (137,7 km/h reais), com um consumo médio na cidade de 20,3 km/litro.
Boa na cidade
A maior qualidade desse motor é sua grande faixa de utilização. Pode-se acelerar em última marcha (6a) praticamente desde os 3.000 rpm até a faixa vermelha, aos 8.500 rpm. A retomada de velocidade de 60 km/h a 100 km/h é feita em 8,9 segundos, a melhor em sua categoria (que inclui a XLX 250R e a Yamaha DT 200). Justamente essa “elasticidade” é que faz da Sahara uma moto muito prática para uso urbano.
A posição de pilotagem proporciona muito conforto e maneabilidade, mesmo a pilotos com menos de 1,70m, que precisam apenas esticar um pouco as pontas dos pés para tocar o chão. Seu estilo "dacariano" também facilita as manobras, graças à boa altura (1.315 mm), que permite rodar pelos corredores de carros sem bater com o guidão nos espelhos retrovisores.
A pavimentação das ruas brasileiras não é exatamente um tapete. Nesse aspecto a Sahara mostra outra face de sua versatilidade, talvez a melhor de todas. Com uma suspensão de longo curso (215 mm na dianteira e 200 mm na traseira) e os benefícios do mono amortecimento central (Pro-Link) na traseira, pilotar uma Sahara nas ruas esburacadas torna-se fácil. O motociclista praticamente só tem o trabalho de levantar um pouco do banco e "bumba!" superar o obstáculo.
Mesmo quem gosta de pilotar com esportividade, encontra na Sahara estabilidade suficiente para permitir curvas seguras em alta velocidade. Novamente o crédito recai sobre a suspensão progressiva e também aos pneus Pirelli MT 40 (3,00 x 21 na dianteira e 4,60 x 17 na traseira) com desenho para uso tanto em asfalto quanto na terra.
Perfeita para uso urbano.
Boa na estrada
A Sahara tem um porte considerado intermediário para quem quiser pegar estrada. Ela fica situada entre as pequenas (como Honda NX 150 e XL 125, Yamaha DT e DT 180) e as grandes (Yamaha XT 600 Ténéré e Super Ténéré, importada).
A velocidade de cruzeiro pode ser mantida na faixa dos 100/120 km/h, mesmo rodando com garupa, por muito tempo, sem cansar o piloto. Só a espuma do banco ainda continua um pouco dura, obrigando paradas para relaxar certos músculos.
Sua vocação estradeira é reforçada pelo pequeno, mas útil, bagageiro. A carenagem oferece uma proteção parcial contra o vento, o frio e a chuva, melhorando o conforto em longas viagens. Mas acima de 140 (de velocímetro) a frente acusa uma oscilação mínima, suficiente para o piloto lembrar que trata-se de uma moto de uso misto e não uma superesportiva. A média de consumo na estrada é de 16,7 km/litro e pode chegar a 20 km/litro à velocidade constante de 100 km/h.
Vamos de wheeling!
Boa de terra
Nem precisa ser um especialista para imaginar a pouca adequação da Sahara às trilhas muito travadas". A grande carenagem e o pouco esterçamento do guidão dificultam as manobras em baixa velocidade, principalmente quando o piloto encontra cavas, ou nos corredores de galhos, entre as árvores. Os pneus também não gostam muito de lama, formando uma camada de barro que deixa a moto como se estivesse com pneus "slick" (liso).
No início de sua comercialização, em setembro de 1990, alguns enduristas até chegaram a usá-la em competições, mas com algumas adaptações como o pára-lama dianteiro da XLX 350R, afastado do pneu. Mais tarde, uma revenda Honda de São Paulo, SP, a Mesbla Motos, chegou a oferecer um modelo híbrido entre Sahara e XLX 350R, batizado de Reborn (renascida). Na transformação, a Sahara volta a ter o visual da XLX 350R, com a vantagem da partida elétrica. Mas é bom lembrar que a Sahara não tem pedal de partida, portanto, existe o risco de ficar atolado em fundo de vale, com a bateria descarregada, cercado de subidas por todos os lados.
Suporta bem os desafios do fora-de-estrada.
Portanto, sua personalidade "dacariana" deve ser endereçada às estradas de terra, com algumas incursões de leve em terrenos arenosos. Nos estradões de terra ela tem um desempenho muito bom, permitindo desenvolver altas velocidades mesmo em curvas. A suspensão, um pouco macia para fora-de-estrada, absorve bem as irregularidades do tipo "costelas", mas chega a bater no fim do curso em saltos ou buracos mais exigentes.
Com seu preço tabelado em Cr$ 255 milhões (US$ 7.200 no câmbio comercial de 13 de maio), a Sahara ainda estava sendo comercializada com descontos que variavam de 8% a 10%. E ainda poderia ter seu preço reduzido com a nova alíquota (menor) do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços).
Dentro das opções de mercado, a Honda NX 350 Sahara fica numa posição solitária. Acima dela está a Yamaha XT 600Z Ténéré, ou brevemente a XT 600E. Em todo caso, a diferença de preço é muito grande, chegando a 55% a mais no caso das Yamaha. Abaixo da Sahara está a Yamaha DT 200, com um preço 25% menor. Na prática, a maior concorrente da Sahara no mercado é uma moto da mesma família, a Honda XLX 250R, que oferece quase os mesmos números de desempenho, a um preço 13% menor.
Geraldo Simões