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Have a Harley day!

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 Não, eu não sou bad boy nem was born to be wild!

 

Como entender o efeito Harley-Davidson nas pessoas

 

Minha primeira viagem a Las Vegas foi em 1997 para um teste de pneus. Não gastei nem um centavo de dólar em qualquer tipo de jogo, nem caça-níquel, mas gastei dentro de uma loja suntuosa que tinha uma enorme moto explodindo para fora. Era o Harley Coffee, na avenida principal. Depois de passar horas lá dentro, mais doido que cachorro em açougue, saí com um belo isqueiro Zippo de metal envelhecido, com o famoso logotipo HD e a frase "Live to ride; ride to live" em relevo. Veio com um belo estojo, realmente muito bem acabado! Custou algo como US$ 20,00.

 

Só que eu não fumo!

 

Meu isqueiro Zippo da Harley: não vendo, não dou nem empresto

 

Quando uma pessoa não-fumante gasta uma grana para comprar um isqueiro - que nunca foi usado e está na embalagem por 17 anos - é sinal que tem alguma coisa esquisita. É o efeito Harley-Davidson e isso não tem explicação. Mas nem adianta me fazer ofertas, porque não vendo meu isqueiro!

 

A respeito dos itens colecionáveis, houve uma época que a Harley faturava US$ 3,0 em collectibles para cada dólar faturado na venda de moto. Quem entra em uma loja HD não consegue sair de lá sem alguma coisa. Tem de tudo, de caneca a mesa de bilhar, de jukebox a jaquetas irresistíveis. Os desenhistas sabem como te conquistar com itens bem acabados e preferencialmente "made in USA". Tem até camisinha HD. Isso mesmo!!! Se levar em conta que os motores Harley são conhecidos pelo grande diâmetro e curso e que vibram bastante, é tudo que você precisa na hora do rala-e-rola!

 

Por mais de 30 anos escrevo sobre motos e há 43 me desequilibro sobre elas. Sempre gostei de motos de todo tipo, mas nunca engoli muito bem essa tal de Harley-Davidson, embora sempre mantivesse o respeito pela marca. Pela moto nem tanto, porque depois de escrever várias vezes a história da marca ficou evidente que a Harley pós anos 90 nada tinha a ver com a Harley dos românticos anos 40/50. Era como se a HD de hoje fosse transformada de moto rebelde em uma comportada yuppie de butique.

 

Tudo nela brilha muito

 

Historicamente a Harley nasceu para ser uma moto mecanicamente simples, barata, de fácil manutenção, destinada a quem não tinha grana pra comprar um BelAir ou um Mustang. Depois de algumas quebras financeiras a Harley foi reerguida e se transformou no maior case de marketing da era moderna, a ponto de fazer um não-fumante comprar um isqueiro!

 

On the road again

 

A sensação ao pilotar a nova Harley-Davidson Electra Glide Ultra Limited é como estar sentado em uma poltrona, com o controle remoto na mão, playlist tocando no aparelho de som e um tremendo ventilador na cara. É uma visão bem romanceada, mas é como estar em uma poltrona sobre duas rodas. Melhor que isso, porque a poltrona viaja a 120 km/h como se o mundo estivesse parado ao seu redor.

 

Para conhecer mais dessa novidade saí com ela duas vezes. A primeira, em maio fui ao ninho das águias, ponto de encontro de Harlistas de várias espécies - e de outras tribos - que tem em comum a paixão quase religiosa pela marca americana: ao Megacycle em São Lourenço, estância climática (e aquática) de Minhas Gerais. A segunda vez em setembro, para ir ao passeio organizado pelo grupo de esportivos da Rota 299. Uma HD no meio de várias esportivas... imagine!

 

Com o cruise control ligado dá pra tirar as mãos e fotografar...

 

Se existe uma trilha sonora que combina com a Harleyzona Electra Glide Ultra Limited só pode ser rock. Por isso tratei de fixar a sintonia da rádio Kiss FM enquanto estava em São Paulo e depois o playlist do iPod, conectado a uma central multimídia do painel que inclui ainda um GPS muito fácil de operar.

 

Como toda touring, a Harley tem muitos comandos, incluindo dois do tipo joy stick, acionados pelos dedões. Na verdade os comandos são pouco intuitivos e exigem muito treino para não desviar o olhar. Até achar a buzina o perigo já passou! No lado esquerdo tem: controle do aquecedor de manopla, pisca, acionamento do cruise control, buzina, farol alto (com lampejador) e o comando do menu principal. No lado direito: ignição, pisca, corta-corrente, faixa do cidadão, seletor do painel, farol auxiliar e controle do navegador.

 

Sobre o cruise control, antes ele era chamado de piloto automático, mas essa nomenclatura foi proibida depois de um acidente com motor-home nos Estados Unidos. Diz a lenda que um red-neck aposentado comprou um motor-home e saiu feliz curtir a vida. Quando entrou na estrada ligou o "piloto automático" e foi preparar um café... acordou no hospital sem entender nada! Depois disso é obrigado a usar a expressão "cruise-control" (controle de velocidade de cruzeiro).

 

É assim: você seleciona uma velocidade, tipo 110 km/h, aciona o cruise-control e não precisa mais acelerar nem na subida. Foi assim que fiz as fotos sentado no banco do garupa! Basta encostar na embreagem ou freio que o sistema desarma. Em viagens longas é uma delícia porque dá pra relaxar o punho direito.

 

Ninguém compra uma Harley pensando na moto. Junto com ela vem um estilo de vida, uma adoração quase religiosa, resultado de um dos maiores cases de marketing da história, ao lado de marcas como Coca-Cola e Gilette. Não existe racionalidade na escolha, porque mecanicamente analisando é um motor quase pré-histórico, com comando de válvulas por vareta, dois cilindros de funcionamento descompassado, que provocam uma vibração maluca e barulhenta. O novo cabeçote arrefecido a óleo ajudou a jogar a potência para 77,8 CV (medidos no dinamômetro, porque é segredo milenar).

 

Trata-se de um motor que gira baixo, do tipo feito para durar séculos. Na velocidade de cruzeiro, a 120 km/h em sexta-marcha, o conta-giros indica apenas 2.900 RPM. Com escape original e a enorme caranagem, o piloto navega silencioso pelo asfalto. Ouvindo rock, like always...

 

Na Harley o sistema de transmissão é por correia dentada. A vantagem é dispensar a lubrificação, duração de mais de 100.000 km e silêncio de funcionamento. Mas tem uma limitação: a baixa resistência à deformação. Não é usada em motos de alto desempenho porque a correia estica e contrai nas acelerações bruscas. Por outro lado, como não desgasta a coroa nem o pinhão basta trocar a correia e rodar mais 100.000 km.

 

Nessa moto ninguém repara que você é careca, baixinho e orelhudo.

 

Cidade alerta

Entre as qualidades que levam um indivíduo a escolher uma Harley desse porte está a tranquilidade de que não será roubada nem furtada. Não é fácil manobrar os quase 400 kg de ferro bruto e as bolsas laterais impediriam uma eventual fuga. Para viajar com garupa é quase um iate, com espaço de sobra nos três compartimentos de carga. Mas se ilude quem acha que o piloto tem a vida mais confortável sobre duas rodas, aliás é uma tremenda lorota essa conversa de que moto custom é mais confortável, porque na verdade as pernas ficam esticadas e as costas retas, com toda carga apoiada na coluna. A coluna sofre todo impacto dos obstáculos. O que salva é o banco gigantesco, com espuma macia. Quem vai na garupa é quase uma moto-leito, dá até pra dormir.

 

Sofrimento é atravessar uma cidade como São Paulo na hora do rush. O motor V-2 esquenta e começa a sauna. Usar o corredor entre os carros nem pensar. O jeito é relaxar e não ter pressa. Ligar o rádio, regular os defletores de ar para suavizar o calor a bordo e se esfriar é só fechar tudo e ligar o aquecedor de manopla. Aliás, na segunda viagem peguei um calor de mais de 35ºC (em pleno inverno...) e os engraçadinhos do encontro ligavam o aquecedor de manoplas o tempo todo! Eu saía com a moto e sentia um calor da p*** nas mãos achando que era o clima mas era a sacanagem mesmo!

 

Tudo fica mais colorido...

 

O habitat dessa gigante é a estrada mesmo, por isso carregue seu iPod, marque o destino no GPS e vá viajar! Quanto mais reta e lisa a estrada melhor. Nas curvas é um festival de balanço e faíscas voando das pedaleiras. Aliás, um acidente comum com motos custom é tentar inclinar tanto nas curvas que a pedaleira faz uma alavanca, tirando a roda dianteira do chão e passando o rodo no cabra pilotador.

 

Tive a sorte de experimentar essa Electra Glide em duas ocasiões, por estradas e climas totalmente diferentes. Em maio peguei frio e chuva e nestas horas o pára-brisa, mesmo baixo, protege bem. E na segunda peguei o calor infernal do interior de SP, quando direcionei os defletores para canalizar o vento para meu baixo ventre e reduzir o risco de ovos cozidos. Um defletor atrás do pára-brisa pode ser aberto para jogar ar também no tórax do piloto e refrescar.

 

Com uma área frontal enorme e a aerodinâmica parecida com um guarda-chuva aberto não dá para esperar que o consumo seja contido. Pra piorar dois baita cilindros de 845 cm3 cada um funcionam como um sumidouro de gasolina. Não fiz cálculo nenhum de consumo porque nesse tipo de moto a maior prova de falta de macheza é perguntar "quanto faz por litro???". Isso é coisa pra motoboy...

 

Falando em macheza, no quesito "pegação de mulé", numa escala de 0 a 10, essa HD estaria perto do 8,5 porque sim, existe muita mina que prefere as motos esportivas por dar mais volume à região glútea. Mas mulheres de verdade gostam de conforto, música de qualidade, apoio para as costas e qualidade de vida, conceitos muito bem respeitados numa Electra Glide. Até um baixinho, barrigudo e careca fica lindo (menos se usar bandana e colete de franjinhas...).

 

Harley Coffee em Las Vegas.

 

Pronto, já enchi liguiça por mais de 8.500 caracteres e quer saber? Se Harley é a sua praia, esta Electra Glide é do Caribe. Pode mergulhar de cabeça, pagar os quase R$ 82.000 sem dó, mas saiba que é como piscina: vai gastar muito pelo pouco tempo que vai passar dentro. Mas quando entra, oh que coisa boa!

 

Em vez de encher seu saco com dados técnicos, cores, preços etc... vai direto na página da HD e leia aquilo tudo.

 


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