Chique no úrtimo: tem carro de R$ 150.000 ruim?
A Audi decide montar o novo motor 1.8 nas versões A4 e A5, veja como ficaram
O discurso já é conhecido: downsizing is beautiful! Quanto menor, melhor. Claro que isso não serve para anatomia humana porque o assunto aqui é carro. E dos bons. Nada menos do que a dupla de Audi A4 e A5 que chega no Brasil em 2015 já com os novos motores 1.8 turbo no lugar dos 2.0 aspirados. Diminuiu a capacidade volumétrica, caiu 10 CV a potência, mas ganhou 7 quilos de torque em relação ao 1.8 antigo, perdeu 7,8 kg em relação ao 2.0 aspirado e melhorou nada menos do que 21% a economia.
Se você não tem o menor saco para o papo técnico pula essa parte, vai direto pro capítulo "como anda" e veja as figurinhas. Mas se quiser entender que na mecânica é possível perder para ganhar, então segue o terço porque a missa é longa.
A expressão "Menos é mais", originada do inglês "Less is more" chegou com força total nos novos modelos da Audi para 2015. Segundo a empresa, mesmo com 10 CV a menos, houve uma discreta queda no rendimento que chega a ser desprezível. Por exemplo, na medição de 0 a 100 km/h o novo A4 2015 fez em 8,3 segundos, enquanto a versão 2.0 fazia em 8,2 segundos. Já a velocidade máxima perdeu apenas 1 km/h, marcando suficientes 225 km/h.
Traseira sexy, lembra a Paolla Oliveira!
É claro que essa diferença de desempenho é ridícula e se você não for um nerd devorador de ficha técnica nem vai perceber. Na verdade, alguns carros dessa categoria estão saindo de fábrica com limitadores de velocidade. Tipo, quando chega a 220 km/h pára de correr. É pouco? Coisa nenhuma porque a maioria dos seres humanos comuns não tem a menor idéia do que fazer com um carro acima de 200 km/h e inevitavelmente faz cagada.
Então, qual a vantagem de reduzir a potência de 180 para 170 cv e a capacidade volumétrica de 1.984 para 1.798 cm3?
A resposta está em um conceito super na moda e que você pode usar muito nas baladas para impressionar as minas: eficiência energética! É como se você em vez de comer dois quilos de coxinha, se alimentasse com 500 gramas de barra de cereal. A energia será gerada do mesmo jeito, só que seu corpo não ficará encharcado de óleo nem sua expectativa de vida baixará. Por outro lado coxinha é bem mais divertida do que Nutry. Por isso, os manos que ainda veneram os Opala e Maverick acreditam piamente que motorzinho é coisa de dentista, sem se dar conta que um motor de aparelho dentário tem 10 cm2 mas gira a uma rotação de 45.000 a 90.000 RPM, enquanto aquela banheira de seis cilindros em linha não passa de 180 km/h e bebe mais que poeta deprimido.
Pode escolher revestimento de couro creme... é meio fresco, mas combina!
Ainda segundo o fabricante, o consumo reduziu em 21%. Nos tempos atuais o desempenho deixou de ser imperativo e se até na Fórmula 1 existe a preocupação com a redução do consumo, não seria diferente nos carros de alto desempenho. Pode até ser uma ferramenta de marketing publicitário, mas economizar é um conceito que vende e muito! Essa busca por eficiência energética obriga a deixar um pouco de lado a potência e comece a valorizar o torque.
Para conseguir manter o desempenho praticamente igual, mas o consumo cair 21% o segredo está no aumento do torque em quase 7 Kgf.m, no gerenciamento eletrônico e na tecnologia da injeção eletrônica indireta multiponto, trabalhando em conjunto com a injeção direta simples. Esse sistema pode realizar até duas injeções por ciclo, mantendo a câmara de combustão sempre com a quantidade certa de mistura. Na prática significa que o motor pode combinar o sistema de injeção com a necessidade. Em baixa e médias rotações atua o sistema de injeção indireta. Já em alta rotação entra em cena a injeção direta. Um gráfico parecido com uma molécula mostrou que existe um enorme trabalho eletrônico para que os cilindros recebam exatamente a quantidade de combustível necessário para aquela abertura de acelerador, cruzando a informação com a rotação do motor. Não existe nem linha de retorno para o tanque de gasolina do excedente, porque não tem excedente.
Teto solar pra mim só se for de boné!
Também os eixos contra-rotantes (contrapesos) da árvore de manivelas passaram de oito para quatro, contribuindo para um emagrecimento do 3,5 kg do motor, sem comprometer os níveis de vibração e ruído. Outras medidas como um novo tratamento no pino dos pistões para eliminar as buchas de bronze e um novo desenho dos pistões ajudaram a "emagrecer" o motor. Em relação ao motor 2.0 a diferença de peso é da ordem de 7,8 kg. O sistema de lubrificação conta com uma bomba de óleo por demanda, assim quando em baixa rotação o motor também trabalha mais livre, sem a pressão nem a massa do lubrificante em excesso. O óleo também trabalha mais frio.
Existe um princípio simples na mecânica: quanto mais leves forem as peças móveis maior é a facilidade para movê-las. Com a redução das massas e, sobretudo, uma injeção eletrônica que consegue se dividir em três formas de atuação o resultado foi o crescimento espantoso do torque totalizando 320 Nm já disponíveis a 1.400 RPM até 3.700 RPM. O que antes era chamado de "curva de torque" pode ser conhecido como "reta de torque".
Se olhar no espelho e vir essas argolas sai da frente!
Como é?
Se você é como eu, que só entra em carro de luxo no Salão do Automóvel prepare-se para babar. O interior é todo forrado de couro e aqui cai por terra todo o blablablá eco-responsável dos fabricantes, porque para fazer um metro quadrado de couro são necessários quase 15.000 litros de água, mas isso ninguém lembra, porque assim que seu corpo encosta no banco e suas mãos tocam o volante a vontade é mais que a vaca vá pro brejo!
No A4 o volante é assimétrico, plano na parte inferior, para facilitar a entrada e saída de alemães baixinhos de 1,90m. Para ligar a gente só empurra a chave e precisa prestar muita atenção porque os níveis de ruído e vibração são tão baixos que demorei um tempo pra perceber que o carro estava ligado. Também por puro jacuzismo fiquei procurando a alavanca de freio de mão pra descobrir que é um botãozinho no console (ainda se chama console?). Aliás, esse botão é o freio de emergência: quando o motorista vê que algo de errado não deu certo basta acionar o botão que o carro pára sozinho. Mas segure-se bem porque eu quase meti a boca no volante a 40 km/h!
O sistema strat-stop pode ser desligado.
O banco tem zilhões de regulagem pra cima, pra baixo, pra frente, pra trás, na região lombar, assim como o volante que sobe, desce, aproxima e afasta. Só um Quasimodo não acha a posição ideal!
No painel as mina pira! Tem tanta informação que eu confesso que só mesmo lendo o "Das Bedienungsanleitung" para saber tudo. Pelo que consegui fuçar é possível saber a velocidade (não diga!), rotação, consumo instantâneo, média, vários trips, marcha, tudo que se passa no motor, óleo, pneus. O ar-condicionado é dual zone para quem vai na frente e também no banco de trás. Fresquinho, o espaço interno é realmente enorme, cabem vários alemães e muito bem acabado com requinte e bom gosto.
Falar em estilo dos carros desse nível é quase um desperdício de latim. Não existe Audi, BMW ou Mercedes-Benz feio! Feiúra é para carros normais, especialmente os da Nissan e GM. O departamento de RH dessas empresas fazem um teste com os candidatos a departamento de design: mostram a foto da Graça Foster, se o cara comentar "que gata!" tá contratado!
No A5 o volante é redondo.
Como anda?
Pra caramba! Anda muito e silenciosamente!
Nosso percurso de teste teve míseros 70 km, incluindo uso na cidade e estrada. Mais ou menos como testar um paraglider saltando da mesa da sala. E tudo em linha reta, portanto nem precisa perguntar como é o comportamento em curva.
Comecei pelo A5 Sportback versão Attractive. Lançado em 2007 essa carroceria hatch pretende ser mais esportiva que a versão sedan A4. Maior e mais pesado que o A4, mesmo assim o motor 1.8 respondeu bem nessa versão, agora com rodas de 17 polegadas de série. O funcionamento do motor e câmbio são praticamente idênticos nas duas versões de carroceria. A ponto de me confundir depois da troca dos modelos durante o teste. Rodei alguns quilômetros com o A5 achando que era o A4, só percebi pelo volante diferente! Por dentro eles são muito parecidos.
Como de praxe na Audi, o câmbio é por sistema de polia variável (CVT) com oito simulações de marchas. Na verdade, os sistemas com variador não tem "marchas" como se conhece nos câmbios por engrenagem. O câmbio CVT é como da velha Mobilete ou dos atuais scooters: parece que está sempre com a embreagem patinando. Parece aquela meleca de câmbio automático do Dodge Polara: o motor berrando feito louco e o carro a 40 km/h. Muita múmia acha câmbio automático coisa de baitola e afirma que legal é trocar marcha. Pois eu digo que boiola é quem curte uma alavanca! Os modernos câmbios automáticos de carros de mais de 150 paus são tão emocionantes quanto um seletivo, sem a encheção de saco da embreagem.
Mas se for pra agradar a homarada, o sistema CVT da Audi por corrente de aço tem um faz-de-conta que é seletivo. Para simular o efeito da marcha o sistema eletrônico mantém a polia fixa em uma medida até o motorista acionar a alavanca ou borboleta no modo manual, nas opções normal e esporte (quando as trocas são em rotação mais alta). A exemplo de outros veículos com câmbio automático, mesmo na opção "Manual" a marcha troca sozinha no caso de ultrapassar o limite de giro para cima ou para baixo. Sim, porque, como nos outros carros modernos, o câmbio tem o "idiot proof system", que troca a marcha sozinho mesmo se o salame insistir em manter o acelerador fincado. Se o motorista insistir na marcha acima de 6.500 RPM o câmbio faz a troca por conta própria
Graças ao sistema com 8 velocidades, o motor trabalha em uma faixa de rotação muito baixa. A 120 km/h, em oitava, o conta-giros revela apenas 1.850 RPM, um pouco acima da entrada da faixa de torque. Isso explica em parte o baixo consumo alegado (que não pude aferir). Para se ter uma idéia do que é isso: 1.850 RPM era a rotação de marcha-lenta do odioso motor GM quatro cilindros que equipava alguns modelos da Fiat.
Chama a atenção nos dois Audi avaliados o baixíssimo nível de vibração e ruído a ponto de se poder conversar dentro do carro em um tom de voz educado. As diferenças mais sensíveis são nas particularidades de cada carroceria. No Sportback a tampa do porta-malas é maior e bascula com o vidro traseiro, enquanto na versão sedan a tampa é isolada. Tampa de porta-malas de carro chique tem o mecanismo de dobradiça embutido. Nos carros baratos esse mecanismo, conhecido como "pescoço de ganso" pode amassar as malas. Imagine o dono de um A4 abrindo o porta-malas e descobrir que a mala de tacos de golfe Louis Vuitton de US$ 20.000 está toda arranhada? Por isso esse mecanismo fica isolado da carga.
Já no quesito espaço interno, o A5 dá um banho com muito espaço para todos os ocupantes, inclusive os do banco traseiro, embora as distâncias entre-eixos sejam praticamente idênticas. Eles tem muito mais semelhanças tanto internamente quanto no funcionamento e só mesmo o gosto pessoal para decidir entre eles.
A resposta para aquela pergunta do motivo da redução do motor pode estar na moderna filosofia de engenharia que serve para tudo. É melhor um sistema menor com mais eficiência energética do que um motor grande que desperdiça energia. Quando se trata de carros entre R$ 140 mil e R$ 170 mil a preocupação com consumo parece besteira, mas não se trata de dinheiro e sim de respeito ao ambiente. Motores menores não apenas consomem menos como também emitem menos poluentes. E hoje em dia esse é um importante argumento de venda.
Mas como tem aquele pobre que adora saber o consumo, preocupação que combina mais com taxista, só para saber que nas duas configurações de carroceria o consumo fica na faixa de 15 km/litro na estrada. Se souber usar o computador de bordo esse consumo pode até melhorar. Mas se quiser experimentar a insanidade de acelerar até acionar o maravilhoso botãozinho no final do curso do acelerador aí esqueça do consumo para ver uma aceleração bem convincente.
O IPM (Índice de Pegação de Mulher) dos dois modelos é alto, com nota 9. Com esses carrões você só sai do carnaval sozinho se for um chato de galocha, não gostar da mercadoria ou tiver mau hálito. Um truquezinho básico é usar o sistema "start-stop" para impressionar. Quando o carro pára ele desliga sozinho e você faz um "ih, pifou!", aí basta pisar no acelerador que ele volta a funcionar, aí finge que é mágico e faz "oh, voltou a funcionar". Espero que funcione!
Veja a lista de equipamentos e fichas técnicas do A4 clicando AQUI e do A5 clicando AQUI.