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De Manaus para o mundo

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Theatro de Manaus: símbolo de uma era de ouro da borracha, que hoje é da indústria. (Foto:Tite) 

A convite da Abraciclo visitamos quatro fábricas em Manaus

Desde criança quando ouvia falar em Manaus e Amazônia minha imaginação corria solta. Rio Amazonas, pororoca, encontro das águas, vitória-régia, boto cor de rosa, peixes enormes e floresta instransponível. Essa era a Manaus da minha infância. Mas a vida me mostrou uma nova Manaus.

A capital do Estado do Amazonas serviu de berço para a indústria brasileira de motos e por isso tive a chance de conhecer não só a cidade, mas o rio Amazonas, a pororoca, o encontro das águas, peixes enormes (e deliciosos), como também a história e grandeza da produção brasileira de motos.

Desde a minha primeira visita como jornalista, em 1992, até esta ocasião a cidade cresceu muito, a economia sofreu vários sobressaltos e novas marcas chegaram ao mercado. E foi para falar de mercado que visitei mais uma vez a calorosa (literalmente) Manaus. A convite da Abraciclo fui participar do evento de apresentação dos dados do primeiro semestre e, de quebra, conhecer algumas fábricas.

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Realmente uma mente brilhante. (Selfie: Tite)

O mercado de motos e de bicicleta está crescendo de forma gradual e saudável. Para o segmento de moto, que já atingiu 2,1 milhões em 2011, falar em 1,3 milhão pode parecer pouco, mas é muito se comparado com o terrível ano de 2017 quando bateu em 883 mil.

A maior preocupação do setor foi escancarada pelo presidente da FIEAM – Federação das Indústrias do Estado da Amazônia – Antônio Silva. Ele deixou claro que o Polo Industrial de Manaus (PIM) está trabalhando sob liminar, porque o ministro da Economia, Paulo Guedes, quer estender a isenção de IPI (imposto sobre Produtos Industrializados) para as fábricas instaladas em qualquer canto do Brasil, ameaçando a subsistência do PIM. Uma medida visivelmente eleitoreira para arrefecer os efeitos de uma crise mundial.

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Números do mercado desde 2011: altos e baixos. 

Ou seja, todo investimento feito nas instalações em Manaus pode virar pó e causar um tremendo colapso sócio-econômico em toda região, que gera cerca de 52 bilhões de Reais por ano e mantém 105.000 postos de trabalho direto.

Tente imaginar o que seria de Manaus sem o PIM. Nos anos 1980 a região foi considerada “zona franca”, o que permitia vender produtos importados com isenção de impostos. Era a festa de quem queria eletrônicos bem mais barato do que nas lojas fora da zona franca. Paralelamente o governo federal incentivou por meio de todo tipo de subsídio a instalação de fábricas do setor automotivo. Foi onde a indústria de motos prosperou.

A implantação da ZFM foi em 1967, em pleno regime militar, que tinha como objetivo incentivar o crescimento e o desenvolvimento de uma região que já tinha sido o umbigo do Brasil durante o ciclo de ouro da borracha. A ZFM não se restringe somente ao Estado do Amazonas, mas vai muito além e atinge também Amapá, Rondônia, Roraima e Acre.

A ideia original era também reduzir as diferenças sociais entre os Estados da Amazônia e os do Sul/Sudeste. Hoje a ZFM conta com 600 indústrias e emprega cerca de meio milhão de pessoas.

Deixando a batatada do Paulo Guedes de lado, os setores de bike e moto estão saudáveis, empregando e gerando receita. É só o governo não atrapalhar. Mas pode ajudar! Uma proposta que tramita nas esferas estaduais é a isenção de IPVA (imposto sobre propriedade de veículo automotor) das motos até 170cm3. Seria uma forma de reduzir o impacto da inflação no preço das motos pequenas, que são as mais procuradas pelos jovens que estão sem colocação no mercado de trabalho, popular desempregados!

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Da esquerda para direita: Antônio Silva (FIEAM), Paulo Takeuchi e Marcos Fermanian (Abraciclo).(Foto:Tite)

Que a moto é uma ferramenta de inserção social no período durante e pós pandemia não é novidade. É por isso que estava em Manaus: meu artigo sobre o papel da moto durante a pandemia recebeu o prêmio Abraciclo e como forma de agradecimento me enfiaram num avião e levaram pra lá visitar algumas fábricas de motos e bicicleta.

Neste momento a tarefa da Abraciclo é sensibilizar 27 governadores a abrirem mão deste imposto (que na moto é baixo) e buscar sanear suas contas usando responsavelmente os recursos, em vez de descarregar tudo nas costas do contribuinte/eleitor.

Quer saber os números?

As bicicletas devem chegar a 750.000 unidades em 2022, que é uma ninharia perto do tamanho do nosso mercado. Mas devo lembrar que esse número se refere às empresas associadas à Abraciclo, portanto pode ser subnotificado.

As motos devem chegar a 1.320.000 em 2022, que representaria um crescimento de 10,5% em relação à 2021, mas o mais surpreendente veio das elétricas. O setor de bicicletas elétricas (não entram motos, nem scooters) cresceu espantosos 393% se comparado com 2019, com 26 modelos disponíveis e representando 1,6% do total da produção. Aqui devo alertar que este número assombroso é mais fruto de uma base muito baixa do que volume. E mais uma vez alerto que são apenas das marcas associadas à Abraciclo, o que pode ser maior porque muito produto vem direto dos países asiáticos para cá.

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A mais vendida: Honda CG 160 Fan. (Divulgação).

No campo das estatísticas, o mercado continua monopolista, com a Honda detendo a fatia de 79,8% do mercado e dona da moto mais vendida, a CG 160 Fan, enquanto a Yamaha mantém o segundo lugar com 16,2%. Isso significa que as outras oito marcas instaladas no Polo Industrial de Manaus somam 4% do mercado.

Dentro da categoria “e outras” a BMW conseguiu os melhores resultados no primeiro semestre de 2022, seguida bem de perto pela JTZ (que monta Hao Jue e Kymco) e pela Kawasaki.

Visitas ilustres

Como parte do meu prêmio Abraciclo de melhor artigo inscrito no concurso, tive direito de escolher três fábricas de Manaus para visitar. Minha primeira vez na cidade, como jornalista, foi em 1992 e de lá, em 30 anos, voltei tantas vezes que perdi a conta, mas todas elas a convite da Honda. Portanto, foi minha chance de ouro de visitar outras fábricas.

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Na Honda, da esq. para direita: Lourival Barros, eu, Keithy Garcia e Patrícia Quitéria. 

Na minha lista estavam a Honda, Caloi e Kawasaki. Mas ao chegar em Manaus, o meu amigo Afonso Cagnino, executivo de Relações Institucionais da Yamaha, praticamente me sequestrou para visitar também a Yamaha e, assim, acabou com a única folga que eu teria para fazer compras...

Padaria Honda

A primeira vez que visitei a Moto Honda da Amazônia o mercado ainda estava gatinhando. Mesmo assim a fábrica já era quase uma cidade dentro de Manaus. A última visita tinha sido em 2012. Impressionante perceber como a linha de montagem evoluiu em 10 anos. Trata-se de uma fábrica de fato: entra lingote de alumínio e sacos de polímeros de um lado e sai moto do outro. Uma moto a cada 23 segundos! Tipo padaria mesmo.

Aliás, nem vou estender em números e dados da fábrica da Honda, mas para ter uma ideia da dimensão, a padaria localizada no refeitório produz 16.000 pãezinhos por dia! Ou tem muita gente trabalhando lá dentro, ou o povo gosta muito de pãozinho!

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Linha de montagem da Honda: limpa, silenciosa e climatizada. Lourival, eu e Chafic Baydoun. (Foto: Honda)

O incrível das linhas de montagem da Honda é que quase não se vê gente. Tem muito processo automatizado, mas o número de contratações só aumenta. Sinal que alguns processos exigem menos pessoas, mas o aumento da produção gera mais postos de trabalho. Outra característica da linha é o conforto térmico e a limpeza. Quem conhece Manaus sabe que o clima só é agradável se você for um réptil pecilotérmico, mas pra seres humanos é cruel. Por isso os quatro sites da Honda são 90% climatizados. Em termos de limpeza, me sentiria muito mais seguro em fazer uma cirurgia de ponte de safena no chão da Honda do que em muitos hospitais!

Yamaha

Quando a Yamaha chegou ao Polo Industrial de Manaus a Honda já nadava de braçada naquelas águas. Por isso a unidade é naturalmente menor, mas não menos intensa. Também é uma fábrica de fato: entra matéria-prima pela portaria e saem motos embaladas no final da linha.

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Fábrica da Yamaha: espaço para produzir muito mais! (Divulgação)

Como a visita foi meio às pressas, fizemos um roteiro mais curto, mas pude conhecer a usinagem, processo que só fábricas de fato desenvolvem. As linhas são mais presenciais e vê-se mais pessoas trabalhando e menos mecanização. O que não interfere na qualidade final do produto. Não canso de repetir que nossas motos feitas nas duas grandes fábricas têm nível de qualidade tão alto que podem ser vendidas em qualquer mercado do mundo.

Tanto Yamaha quanto Honda têm produção muito verticalizada, ou seja, que dependem muito pouco de fornecedores. Nos modelos básicos a verticalização é de mais de 90% porque as fábricas ainda não fazem pneus nem baterias. Por enquanto.

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Da esquerda para direita: Rafael Lourenço, eu e Afonso Cagnino.

Verde madura

Depois de circular pelas linhas de montagem das duas gigantes do mercado, fiz questão de conhecer uma unidade que trabalha inteiramente em PPB – Processo Produtivo Básico. Dentro deste princípio os componentes chegam de várias partes do mundo e são montadas aqui. É tipo um enorme kit Tamya de plastimodelismo.

Por isso parem com essa bobagem de chamar todas as fábricas de “montadoras”, porque existem as fábricas, que transformam matéria-prima em produto final; e existem as montadoras, que recebem os componentes e aqui juntam, colam, aparafusam e soldam para virar uma moto.

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A bela vista ao lado da planta da Kawasaki, às margens do rio Negro. (Foto: Tite)

Meus sinceros parabéns ao executivo que escolheu o local da planta da Kawasaki. Fica às margens do rio Negro, exatamente onde ele se encontra com o rio Solimões, gerando o mundialmente conhecido “encontro das águas” (lembrei da minha professorinha).

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Da esquerda para direita: Márcia Pontes (Abraciclo), Satoshi Fujimoto (Kawasaki), Analuiza Tamura (SD Press) e eu.

Neste cenário tivemos a chance de conhecer a linha de montagem extremamente silenciosa e confortável, porque não tem fornos, nem prensas, nem cadinhos escaldantes com alumínio derretido. É uma estrutura grande, arejada, mas muito produtiva. Nela são montadas desde a queridinha dos jovens a Ninja 400, passando pelo lançamento Z 650SR, pela desejada Z 900RS e até as motocross.

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A Kawasaki é uma marca querida pra mim porque foi minha patrocinadora por três anos!

Fábrica de ciclistas

Uma das fábricas mais antigas do Brasil é de bicicleta. Sim a Caloi iniciou como loja ainda no século 19. Mas a primeira fábrica foi inaugurada em 1945, no bairro paulistano do Brooklin. Coincidentemente era bem perto da minha casa quando eu morei no mesmo bairro. Aliás foi esse o motivo de eu ter escolhido a Caloi: é a marca que participa da minha vida desde que nasci!

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Primeira fábrica da Caloi no Brooklin, do lado da minha casa.

Pouca gente sabe, mas o pioneirismo da Caloi se repetiu ao ser uma das primeiras marcas a se instalar no Polo, em 1975, antes mesmo da Honda! E a idade se revela na linha de montagem. Claro que é uma instalação que acusa o peso da idade, mas o que chama atenção é a produção totalmente artesanal. São poucos os processos mecanizados.

A maior surpresa aparece no final: o elevadíssimo nível de qualidade e acabamento das bikes. Não é à toa que a fábrica foi escolhida para produzir as bicicletas da Decathlon, empresa francesa de varejo conhecida pelo rigor na contratação de fornecedores. Também produz as famosas Cannondale, GT e Schwinn. Tive a chance de ver o rigoroso cuidado técnico para montar uma Cannondale de R$ 40 mil!

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Na fábrica de ciclistas, da esquerda para a direita: Márcia Pontes (Abraciclo), eu e André Luiz (Caloi).

O parque instalado tem capacidade para produzir até 600.000 bikes por ano, mas hoje a realidade é de 420.000/ano, suficientes para dar o título de maior fabricante de bicicletas fora da Ásia. Nessa planta que visitei são produzidas bikes de aço e alumínio, que hoje representa a maior parte da linha, mas em breve pode começar a produzir também as sofisticadas bikes de carbono.

Isso porque aquela fábrica inaugural já saiu das mãos da família Caloi há muitos anos. Teve 70% comprada pela Canadense Dorel, mas também já mudou de novo. Hoje ela pertence à holandesa PON Holdings, maior fabricante de bicicletas do mundo, dona das marcas Gazelle, Santa Cruz, Cervélo, entre outras. Ou seja, hoje temos uma fábrica em Manaus que irá produzir algumas das melhores bicicletas do mundo! Bem aqui do lado!

Para saber os dados completos basta clicar AQUI.


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