Foram 3.600 km pilotando um sonho! (Todas as fotos autorais)
A História da Foto: uma viagem de CBX 750F pelo planalto
O ano é 1986, a moeda era o Cruzado e a moto mais desejada do mercado era a Honda CBX 750F, importada do Japão. Foram apenas 800 unidades colocadas à venda, o que gerou uma briga de foice e um ágio estratosférico em plena época de inflações galopantes e rastejantes.
Eu estava com 27 anos, trabalhava como editor da revista Clube Honda e como redator na revista Duas Rodas. Naquela época jornalista especializado tinha um peso muito diferente perante as fábricas. Nossas opiniões determinavam estratégias de mercado, definiam mudanças nos produtos e eram muito bem respeitadas pelas matrizes lá no distante Japão.
Por isso tínhamos muito mais liberdade para escolher a pauta e definir como e onde testar as motos. Nesta viagem eu aproveitei um jogo da Seleção Brasileira para rodar o máximo com as estradas vazias. Deu certo e ainda com a vantagem da prorrogação e pênaltis. (eu contei uma parte dessa história AQUI)
Note que a redação foi toda na terceira pessoa. Um recurso chamado “plural majestático”, usado para não criar uma aproximação com o leitor. Dá a impressão que eu estava acompanhado, mas estava sozinho, deliciosamente sozinho.Depois de insistir bastante os editores me deixaram escrever na primeira pessoa.
Também perceba como a liberdade de redação permitia escrever que eu viaja a 140 km/h em estradas com limite de 80 km/h. Mentira, eu viajava muito mais rápido do que isso, Várias vezes passei de 200 km/h principalmente durante o período do jogo.
Saudades dessa época política e totalmente incorreta. Não foi um teste da moto, mas servia apenas para incentivar o público a comprar uma sete-galo e sair viajando pelo Brasil. O que lembro dessa moto é ter nas mãos um sonho de consumo de milhares de brasileiros e com liberdade para fazer qualquer coisa. A roda dianteira de 16 polegadas me fez pular mais que siri na lata, mas com 27 anos ninguém tem problema de coluna. Quanto mais eu andava, mais queria andar. Só parava pra abastecer (não faço ideia de consumo), comer e dormir. Viajei à noite, de madrugada, sob chuva, neblina, de calça jeans e casaco de couro.
Agora uma confissão: no trecho de serra de Teresópolis para o Rio de Janeiro eu fiquei tão pirado com as curvas e a qualidade do piso que chegando no fim da serra, fiz o retorno e subi tudo de novo, para descer mais uma vez!!! Pouco tarado! Ah, e quando eu comentava sobre as ótimas estradas, lembre que isso foi 34 anos atrás!!!
Fiz centenas de fotos, mas só publicamos estas e o arquivo se perdeu nas várias mudanças de editora. Aproveite mais uma história da foto!
Levei essa sete-galo japonesa para conhecer Brasília! (Fotos: Tudo eu)
Uma CBX pelo Brasil
Um dia ideal para viajar de moto tem que ser ensolarado. A melhor estrada deve ter um asfalto liso, ser bem sinalizada e de preferência sem muitos carros e caminhões. Portanto não houve melhor opção de roteiro do que conhecer Brasília a bordo de uma Honda CBX 750F num sábado em que a Seleção Brasileira de Futebol tentava passar pela França e alcançar a semifinal da Copa do Mundo de 1986.
1.000 quilômetros por dia
A equipe de Clube Honda saiu de São Paulo pela manhã com a intenção de rodar o máximo possível antes que o jogo terminasse, e assim aproveitar que o País inteiro estava diante da tela de TV, esvaziando as estradas. O plano de viagem previa uma jornada direta até Goiânia (GO), com escala em Uberlândia (MG) para almoço e descanso.
Nos primeiros 100 quilômetros de estrada deu para sentir que os outros 900 seriam vencidos sem dificuldades. A moto se mostrou extremamente confortável e a velocidade de cruzeiro (atual cruzado) podia ser até de 140km/h mantendo absoluta segurança, graças tanto aos três discos de freio, quanto à estabilidade que a moto oferece. As estradas até o triângulo mineiro são a Rodovia dos Bandeirantes, com quatro faixas em cada pista e a Via Anhangüera, com duas faixas nas duas pistas. O piso está em ótimas condições e qualquer moto pode trafegar mesmo à noite com muita segurança.
Fotografar era uma paixão, mas esse quadriculado é resultado do escaneamento da revista, o popular muarê.
Cidade fantasma
Depois de quase 700 quilômetros rodados, chegamos a Uberlândia com muita fome e vontade de ver e conversar com pessoas, enfim sair da clausura de um capacete fechado. Mas para nossa surpresa a cidade estava completamente vazia. O comércio estava fechado, inclusive bares, lanchonetes e restaurantes Um ou outro cidadão corria de um lado para outro, aproveitando o intervalo do jogo.
A única saída foi parar num dos restaurantes de estrada. Foi aí que descobrimos aonde é que estavam os caminhões. Todos os caminhoneiros e até ônibus de turismo tinham parado para assistir ao jogo.
Tomamos um lanche rápido para aproveitar os 45 minutos finais da partida com a estrada vazia. Não ia ser fácil rodar 300 quilômetros em 45 minutos, mas acabamos “ganhando” mais 30 minutos de prorrogação e quando começava a escurecer paramos pela última vez na estrada.
Pela expressão dos caminhoneiros parecia que não vinha boa notícia pela frente. De fato o Brasil tinha acabado de ser eliminado na disputa de pênaltis e não era nada agradável a visão de motoristas frustrados "empurrando" a derrota goela abaixo com ajuda de pinga.
Mansões do Lago Paranoá, só casa bacana mantida com seu dinheiro!
Fizemos os últimos 200 quilômetros à noite, apreensivos com a reação dos outros motoristas devidamente "calibrados". A estrada a partir do Rio Grande na divisa dos estados de São Paulo e Minas Gerais, passou a ter pista única com uma faixa cada e à noite os dois faróis halógenos da CBX 750F ajudaram a manter a segurança até chegarmos definitivamente em Goiânia.
A capital brasileira das motos
Nunca soubemos de alguma pesquisa neste sentido, mas provavelmente Goiânia é o lugar com mais motos por habitante do Pais. A moto é o veículo oficial da região. Desde o dono da fazenda, até o boiadeiro todos têm motos. E nem mesmo a derrota do selecionado brasileiro afastou os goianos da Praça Tamandaré, ponto de encontro dos motoqueiros. A chegada da CBX 750F na cidade fez o povo esquecer um pouco do futebol. Até o porteiro do hotel quis saber tudo sobre a moto.
A espinha dorsal da cidade é mesmo a Praça Tamandaré e algumas ruas em volta. Além de muita moto, a cidade também goza (ệpa!) de um enorme contingente de mulheres bonitas, portanto quem gosta de moto e de namoro corre pra Goiânia. Mas existem outras atrações, para quem não é chegado em motos (ou namoro), como a Feira de Artesanato Universitário, que acontece aos domingos de manhã na Rua Goiás.
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Bom dia, Brasília
Saímos de Goiânia com destino a Brasília, mas antes fomos conhecer a cidade histórica de Goiás, com suas construções do século XVIII e ruas com calçamento original. E um passeio imperdível, uma espécie de volta ao passado, rodando por ruas que mantêm as mesmas características e construções, desde a sua fundação, no início da colonização brasileira. Não deixem de ver os artesanatos em barro e pedra-sabão expostos na Associação dos Artesãos de Goiás e no Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Goiás.
Cidades históricas e feira de artesanato.
Próxima parada, Brasília. A cidade planejada, construída no centro geográfico do Brasil, resultado do sonho do ex-presidente Juscelino Kubitschek e que tem como maiores atrações as próprias construções, que são verdadeiras obras de arte da arquitetura. Para quem não consegue passar tantos quilômetros sem ver uma gota d'água, em Brasília pode aproveitar para conhecer a península dos ministros, à margem da lagoa de Paranoá, aonde estão as residências oficiais dos ministros e embaixadores.
Um bom lugar para se perguntar o que é que fazem com todo dinheiro que o País pede ao Fundo Monetário Internacional...
A noite em Brasília oferece muitas opções de programas, desde concertos musicais, até peças de teatro, além das boates e bares. Não existe um ponto de encontro dos motoqueiros, como em Goiânia, mas a rapaziada natural se reúne no bar Bom Demais, que além de fornecer boa comida natural, costuma apresentar eventos como música instrumental, lançamentos de livros, leitura de poesias e o que mais rolar pela Capital.
Aliás, tem gente que diz que o Brasil tem uma capital que é federal! Hum, esta foi nacional.
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Voltando pelo litoral
O planalto Central, onde estão Brasília e Goiânia, se caracteriza pelo clima quente e seco. Portanto não resistimos a tentação de voltar a São Paulo "cortando caminho" pelo Rio de Janeiro e aproveitar para verificar como estão as estradas por estes lados.
Entre Brasília e Belo Horizonte, dormimos em Luizlândia, num confortável hotel de beira de estrada, a um preço confortabilíssimo de Cz$ 60,00 por pessoa. A estrada até Belo Horizonte está passando por algumas
reformas e convém prestar muita atenção, sobretudo à noite, nos trechos em reparos. Além disso, os boiadeiros costumam levar suas 3.654 cabeças de gado para passear pelas estradas, o que representa dois perigos para os motociclistas, transformar uma vaca em virado a paulista ou escorregar num cocô bem no meio da curva Neste trecho, duas paradas obrigatórias: a represa de três Marias, na cidade do mesmo nome e a Gruta do Maquiné, na cidade de Cordisburgo, ambas já no Estado de Minas Gerais.
A foto original é bem mais bonita por causa da paineira em flor.
A viagem de Belo Horizonte ao Rio de Janeiro passa por regiões bonitas, com a estrada em excelentes condições e atravessando cidades serranas como Petrópolis e Teresópolis, já no Estado do Rio de Janeiro.
Enfim, maresia
Depois de dias e quilómetros sem sentir o cheiro do Oceano Atlântico, aterrissamos no Rio para um breve pernoite e iniciamos a última e mais agradável parte de roteiro, Rio-São Paulo pelo litoral, através da BR 101. Ao nosso lado esquerdo o Oceano, ao direito a Serra do Mar e embaixo de nós a fantástica CBX 750F vencendo as curvas da Serra com estabilidade de fazer inveja ao nosso melhor carro esporte.
Finalmente o cheiro do mar e um pouco de curva para quebrar a monotonia de quase 2.500 quilômetros de reta. Fizemos duas paradas obrigatórias: em Angra dos Reis, para ver de perto a usina nuclear, e em Paraty para saborear frutos do mar vendo as construções antigas ainda preservadas e conservadas.
Três mil e seiscentos quilómetros depois, estamos novamente em São Paulo. Foram seis dias de vagem somente por estradas asfaltadas e bem conservadas. Um roteiro indicado tanto para as novíssimas e velozes CBX 750F, quanto para as CB 450. Mas isso não impede que um proprietário de qualquer moto de 125cc ou 250cc siga o mesmo roteiro. Apenas terá que se um pouco mais paciente sem nenhuma pressa para terminar a viagem.