Joe Roberts: de coadjuvante a ator principal. Note as duas manetes na mão esquerda. (Foto: MotoGP)
Foxcinante!
Minha estreia como comentarista esportivo
Na verdade não foi bem uma estreia porque eu já havia comentado o GP Brasil de Motovelocidade em Interlagos (1992) para a Jovem Pan. Mas foi a primeira vez na TV e para um público tão grande. Confesso que tremi.
O convite foi feito na quinta feira pelo meu amigo e colega Flavio Gomes, conhecido há décadas pelos comentários de Fórmula 1 e meu parceiro no Anuário AutoMotor. Diante do meu interesse ele comunicou a gerência da emissora que na sexta-feira mandou um recado com os dados de voo, hotel, taxi etc. Assim, em menos de 24 horas eu estava inserido na equipe da Fox Sports para comentar a primeira etapa do campeonato de 2020, nas categorias Moto3 e Moto2.
Foram duas noites sem dormir direito, cheio de borborigmos em vários tons até pegar um taxi na porta do hotel mega chique na Barra em direção aos estúdios da Fox, ali do lado.
Parece um ovo com fone de ouvido!
Encontrar Edgard de Mello Filho depois de quase 25 anos foi uma festa. Fizemos algumas pautas bem bacanas sobre motos e sempre acompanhei a carreira dele desde o tempo que ele corri de Opala e mandava o sapato em Interlagos. Cheguei super nervoso que nem uma virgem no altar e quando meu outro velho amigo Téo José abriu a transmissão eu gelei! Gelei e fiquei mais duro que bode na canoa. Não conseguia falar, nem olhar pros lados. Paniquei.
Até que ele chamou meu nome pra começar a comentar e aos poucos fui acalmando e entrando no clima. Posso garantir que é bem mais difícil do que imaginava. Fazer ao vivo é como desenhar com lápis sem borracha. Tipo tatuador que desenha direto na pele sem decalque.
Desse lado praquele: Eu, Téo José e Edgard Mello Filho, o trio velocidade.
Quando tivemos um intervalo entre as baterias consegui relaxar e na hora da Moto2 a coisa rolou bem mais tranquila, fazendo uma parceria mais afinada com Edgard. O resto foi controlar os nervos e tentar falar de forma mais clara.
As corridas
Fiz a lição de casa direitinho, pesquisei os pilotos, equipes, dados técnicos e mesmo assim já mandei uma batatada logo de cara ao afirmar que a Moto3 tinha 60 cavalos, quando na verdade tem 75. Culpa do Google que me mandou pra uma matéria velha.
Alguns amigos comentaram: ah você precisa decorar o desenho dos capacetes. O quê? Pirou? Qual o tamanho da tela de vídeo na cabine? É igual à sua TV de casa. Além disso os capacetes são super parecidos, melhor é olhar os number plates e decorar.
Os óculos de daltonismo pra não chamar Honda de Kawasaki.
Pra minha sorte o Téo José que é um baita profissional estudou muito e chegou na cabine com um monte de anotações. Aprendeu a pronúncia dos nomes, decorou os números e mandou super bem. E o melhor de tudo: sem piadinhas bestas tipo “você que comprou a TV de plasma e pagou em 12 vezes no carnê”! Aprenda uma coisa: assinante da FoxSports compra TV à vista.
Na Moto2 eu já estava mais soltinho que arroz da vovó. Consegui estudar muito o pole-position Joe Roberts, a carreira, o passado e que não tem parentesco com Kenny Roberts nem com a Julia Roberts. O carinha começou a correr aos QUATRO anos de idade na modalidade Flat Track (oval na terra). Estreou no mundial de Moto2 em 2017 sem fazer todas as provas e seu melhor resultado foi 10º correndo na equipe AGR. Em 2018 fez todas as etapas na equipe NTS correndo com esse chassi NTS muito peba e seu melhor resultado foi 13º. Até que em 2019 mudou para a equipe KTM e seu melhor resultado foi um 14º lugar. Quando veio a primeira etapa de 2020 o cara cravou a pole-position.
Esse histórico mostra que não dá pra julgar um piloto só pelos resultados. Fosse assim o Joe Roberts não teria fechado contrato com a equipe American Race, com chassi Kalex. Ele não era um piloto ruim, só estava mal equipado e bastou sobrar um equipamento de ponta pra cravar a pole, liderar boa parte da corrida e ainda chegar em quarto, somando mais pontos do que as três temporadas anteriores!
Durante a corrida eu reparei que ele usa o freio traseiro na mão esquerda. Tentei falar isso na transmissão, mas não deu. Esse freio na mão esquerda é tema de um monte de discussão. A maior parte delas por pessoas que não entendem um cazzo de pilotagem. Os pilotos americanos e alguns australianos são criados em categorias de ovais na terra (o já citado flat track ou dirt track). Nestas provas as motos não tem freio dianteiro e o piloto comando a moto só no traseiro, usando a derrapagem como complemento da frenagem.
Quando chegam nas corridas de asfalto descobrem que não dá pra acionar o freio traseiro em curva pra direita. Como eles não usam mais a embreagem pra trocar de marcha, podem usar a mão esquerda pra frear o traseiro. Assim conseguem frear para os dois lados da mesma forma. E a pista de Losail gira horário, com mais curvas para a direita.
Mas o melhor da Moto2 foi sem dúvida a vitória – primeira – de Tetsuda Nagashima, da equipe Red Bull KTM, que largou lá atrás em 14º e veio comendo pelas beiradas até assumir a ponta a três voltas do fim. Foi uma aula de como economizar pneus e ele já pode abrir a disciplina Administração de Pneus na Universidade de pilotos. Foi super emocionante, pena que também não consegui comentar mais no final porque o sinal saiu do ar logo após o pódio.
Detalhe interessante foi a volta de Tom Luthi à categoria depois de uma claudicante temporada na MotoGP. Nenhum demérito voltar de categoria, porque às vezes é reflexo de o piloto “casar” melhor com um tipo de moto. Hoje a Moto2, com o motor tricilíndrico Triumph de 767cc está bem perto da MotoGP com 990cc. Pode ser que nesse formato o Tomas Luthi se encaixe melhor na categoria. Pode esperar que ele vai pra cima*. *post edictum - Obrigado pela correção: o Tom Luthi voltou para a Moto2 em 2019 e já mordeu o calcanhar dos líderes.
Moto3
Sabe que mais? Fizemos o tempo todo sem o live timming! Live Timming é a tela da cronometragem oficial que fica aberta direto dando todos os tempos de volta de cada piloto, as distâncias, trechos rápidos enfim, toda informação que ajuda a se achar na corrida. Não funcionou e isso nos deixou várias vezes sem saber o que tava rolando.
A Moto3 foi aquela tradicional briga de foice no elevador com a luz apagada. A molecada cheia de hormônio querendo aparecer e todas as voltas como se fosse a última da vida deles. Albert Arenas (pronuncia-se Albért e não Álbert) saiu na primeira fila, segurou a onda e as Honda porque conseguiu colocar a KTM na frente de OITO Honda!!! Teve japonês bravo nos boxes!
Essa categoria é a mais raiz de todas porque não tem quase nada de eletrônica e se o piloto perder 300 RPM numa curva passam uns oito por ele. Foi muito difícil de narra e comentar porque tem zilhões de ultrapassagens por volta de dezenas de quedas (o Téo ainda está com a cabeça no automobilismo e fala que o piloto”bateu”).
Ainda não sei se farei todas as etapas. Estamos negociando e espero profundamente que assim seja. Me aguardem porque agora é #titenafox